quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O ARISTÓTELES SABIA DE FUTEBOL?


É uma das falácias mais comuns em lógica: a confusão entre o todo e a parte. A extensão dos termos que formam as premissas é das regras mais difíceis de entender e de praticar no discurso do dia a dia.

Vem isto a propósito de um amigo que gosta de construir puzzles, o que também tem regras: começa-se pelas peças de fora, mais fáceis de identificar por terem sempre um rebordo reto e acaba-se na última peça central.


Uma equipa de futebol é igual a um puzzle e sofre, muitas vezes, da falácia da extensão, confundindo-se o melhor jogador da equipa com o trabalho coletivo do conjunto.


Se ontem foi (mais uma) noite de Cristiano Ronaldo, foi também a noite de um trabalho de construção paciente - como um puzzle - em que João Moutinho, William Carvalho e Hugo Almeida tiveram papeis fundamentais no brilho da peça central.

Cristiano Ronaldo foi aquele último pedaço que transforma um amontoado de peças na mais brilhante reprodução de uma bela fotografia, mas que não faz sentido sem todo o conjunto à volta.


É verdade que Portugal tremeu - talvez mais nós em casa que os jogadores lá dentro do campo - depois do 2-1 marcado por Ibrahimovic - também ele peça central, brilhante, mas sem o conjunto à volta. Mas até esse momento, meros 10, 15 minutos de um jogo que teve 180 minutos, nada fez tremer o puzzle português.

Ruí Patrício tinha salvo o 1-0 para a Suécia antes de Ronaldo, a passe de João Moutinho - e que passe!... - fazer o primeiro golo que (parecia na altura) resolveria a eliminatória.

Quando surgiu o verdadeiro Ibrahimovic, foi apenas por a peça Bruno Alves se ter deslocado uma fração de segundo. Quando voltou ao lugar, apenas um lance de bola parada fez mexer o puzzle português. Mais uma vez, Ibrahimovic, claro! Numa coisa ele tem razão: um mundial sem um jogador com a sua classe faz menos sentido!... Que me perdoem os portugueses fanáticos e fundamentalistas!...


No futebol, ao contrário dos puzzles normais, mudam-se as peças não por encaixarem mas por não fazerem sentido. E William Carvalho fez todo o sentido naquele lugar. Quando deu a bola a Hugo Almeida e este, como num puzzle, encaixou em Cristiano Ronaldo, fez a peça que faltava voltar ao lugar.

O mesmo Hugo Almeida que tinha servido de parede à defesa sueca; que tinha desconjuntado as primeiras peças da Suécia e não permitira que o conjunto fizesse sentido. O mesmo que Ibrahimovic tentara com Pepe e Bruno Alves e não conseguira!

O 2-2 para Portugal era tão natural como o Aristóteles saber as regras da lógica: o todo nunca se pode confundir com as partes; o raciocínio tem regras e o futebol tem peças que encaixam umas nas outras e formam equipas.



Mas João Moutinho havia de voltar ao jogo. A peça Cristiano Ronaldo tinha de encaixar nas outras, menos brilhantes, talvez, mas sem as quais não tinha onde se segurar. O terceiro golo de Portugal é mais um passe, outro, que serviu para fechar o puzzle e revelar a foto no seu conjunto.

Foi, finalmente, a noite (mais uma) da parte Cristiano Ronaldo, servido pelo todo de Rui Patrício a Hugo Almeida, passando por Pepe, Miguel Veloso, Raul Meireles e companhia. Aristóteles ficaria contente porque a lógica fez sentido; e o meu amigo dos puzzles também porque há uma peça que, sem ela, nada faz sentido.



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